abril 29, 2012

Conto: Um domingo.


O dia está frio, ela está embaixo de algumas cobertas terminando mais um livro enquanto ouve alguma música calma. Onde já se viu, ler enquanto ouve música? Pois ela sempre fora assim, a música deixa tudo mais bonito, até nos livros. As páginas vão indo, ela não quer que termine, não somente pela paixão pela leitura, mas também o que faria em pleno domingo, sozinha, sem livros? A internet não interessa, o frio dá preguiça, os amigos todos já tem companhia. Era só ela, ali, no meio de cobertas e uma leitura para disfarçar a solidão. 
O livro acaba. Fim. Último frase lida e relida. Ela odeia finais, e odiou ainda mais esse que a deixou sozinha. Ligou a tv, passou todos os canais três vezes e não achou nada. Ligou o computador, olhou todas as redes sociais e não encontrou ninguém. Abriu a janela, sentiu o ar frio tocar o corpo, desistiu de sair. Então era isso, ela estava sozinha e sem ter o que fazer. Nada. Nadica de nada. Nem louças para lavar, tarefas para fazer, matéria para estudar, absolutamente nad... Seu celular toca. 
- Oi?
O número era desconhecido. 
- Oi! Tudo bem?
- Tudo... Quem é?
- Marcelo. Não vai me perguntar se estou bem?
- Não conheço nenhum Marcelo, desculpa.
- NÃO! Não desliga não, espera. Agora já conhece algum Marcelo, eu! 
- Como conseguiu meu número?
- Chutei.
- Chutou?
- É ué, pensei numa combinação e deu aí. Gostei da sua voz, acho que dei sorte.
- Ah, ok. Tchau.
- Não! Desculpa! Estou sendo grosseiro, me desculpa? Vamos começar de novo. Qual é o seu nome?
- ...
- Tudo bem, não fale, eu sei que é Luiza.
O nome dela é Luiza. Ela fica com medo.
- Não é. 
- Eu sei que é. 
- E como pode ter tanta certeza?
- Vi nas tuas correspondências.
- Andou fuçando nas minhas coisas? Ei, quem é você? 
- Desculpa, sou curioso. Sou o Marcelo, já disse.
- Bem se vê que é curioso. 
- Vê não, porque você não me vê. Já eu...
- Como assim "já eu"? Está me vendo?
- Seu moletom rosa é lindo. 
Ela se desespera. O moletom era realmente rosa. Ela olha ao redor, não encontra ninguém, é claro, estava sozinha. Mal repara na cortina ainda aberta da sacada...
- Você está me assustando. Vou desligar, tchau. 
Desliga. Ainda assustada dá algumas voltas pela casa e resolve deitar-se um pouco. Talvez o sono ajude a esquecer tudo isso e amenize o dia chato. Deita. Vira para a esquerda, vira para a direita, remexe as cobertas, enfim, levanta. Vai para a cozinha, resolve preparar um chá, pra ver se esquentava por dentro toda a falta de companhia. Pensa cada vez mais no tal do Marcelo, quem seria? Como descobrira seu nome? A campainha toca. Quem seria a essa hora num domingo? Abre a porta e se depara com um menino com algumas cartas na mão, toda a ilusão de ser uma companhia foi-se, era apenas o carteiro. 
- Olá! - diz o rapaz. Um carteiro muito bonito, ela pensou. Bonitos olhos, lindo cabelo, sorriso aconchegante e covinhas na bochecha. 
- Oi! - ela sorri enquanto tenta arrumar o coque já frouxo dos cabelos. 
Ele olha delicadamente para ela, vendo-a arrumar seu cabelo com um pouco de dificuldade, ri. 
- Difícil aí? 
Ela ri dele, e cora. Solta o cabelo, como quem desiste.
- Seu cabelo é lindo. 
- Obrigada. - Ela diz sem jeito. - Hm, essas cartas são minhas?
- Ah, sim, é verdade, são suas. - Entrega as cartas em suas mãos, esticando os dedos ao máximo para tocarem nos dela. - Desculpa. 
- Desculpa? Por entregar as cartas? Primeira vez que ouço isso! - Ela ri. - Acho que é seu trabalho, não é? 
Ele ri com gosto. 
- Não, não... Não sou carteiro. 
- Não? Então estava fazendo o que com as minhas cartas?
Ela estava assustada. 
- Nada. Não se assuste assim, eu queria saber seu nome, então pedi para o carteiro me entregar as cartas para que eu pudesse saber mais sobre você. 
- Isso é estranho, e um tanto quanto assustador. Acho melhor você ir agora. 
A chaleira apita. A água ferveu.
- A chaleira. - ele diz. - Pode ir lá, eu fico aqui esperando, já que eu duvido muito que me deixaria entrar e sentar no seu sofá amarelo que está nesse momento lotado de livros da faculdade desde sexta. 
O coração dela para. Afinal, como ele sabia de tudo isso? 
- Você é louco! - Ela fecha a porta.
Um pouco atordoada vai terminar o chá. Serve-se numa caneca grande e vai para a sacada tomar um ar fresco para ver se resfriava um tanto a cabeça. Na sacada repara nas ruas, calmíssimas, tudo calmo. Ela ouve uma música alta vindo do prédio vizinho, era Oasis. Começa a cantarolar e tenta descobrir de qual apartamento aquela música vinha. Até que um apartamento abre a porta da sacada, e de lá sai um rapaz. Era o carteiro que não era carteiro. Ele olha fixamente para ela e ela agora ri quase engasgando com o chá.
- Não sou louco. Sou seu vizinho. Você que é louca por deixar essas cortinas abertas o dia todo, tem sido meu canal favorito te observar.
- Eu... Nossa... Desculpa ter sido grossa, você me assustou.
- Tá tudo bem. Sabia que me procuraria quando ouvisse a música.
- Não acredito que ouve Oasis também. 
- Não ouvia, mas desde que você começou a ouvir sem parar a alguns meses, aprendi a gostar.
Ela ri sem graça.
- Desculpa.
- Chega de desculpas, você pede desculpas demais menina!
Ambos riem.
O dia estava frio, o cara tava ali, só esperando um convite, ela estava sozinha, tinha um filme locado a dias ali na estante da sala, o colchão no chão da sala chamava visitas, tinha chá para mais uma caneca...
- Quer um chá? 
- Beleza! Estica aí bem o braço que eu acho que alcanço! 
- Larga de ser bobo. 
- Louco, bobo, começamos tão bem. Mas ok, já estou indo. 
Em poucos minutos a campainha toca, era ele.
- Vamos começar direito então. Prazer, Luiza! - estica a mão para que ele a cumprimente.
- Prazer Luiza, mas eu já sabia. 
- Não vai me dizer o seu?
- Mas já disse.
- Não disse. 
- Marcelo.

O que aconteceu? Não sei, ainda é domingo, e dessa vez a cortina tá um pouco fechada, mas daqui eu consigo ver dois pares de pés juntinhos embaixo de cobertas no colchão da sala. Eu, quem sou? Uma vizinha de um terceiro prédio, que tem vista para essas duas sacadas, e que sacou tudo isso bem antes que qualquer um dos dois. 

Um bom domingo e um ótimo feriado para vocês, viu? Beijos no coração! 

5 comentários:

BlairC disse...

Meu deus *0* que lindo, adoro os seus textos sério.
Amo ainda mais aqueles com falas e este é muito lindo *snif snif*
Amo este tipo de textos, continua a sério *-*
Bjus^^

Sabrina disse...

Ai que liiiiiiindo, me fez querer ser essa menina. Amei o texto *--*

Gabriela Freitas disse...

Que lindeza, adorei o conto, álias, adoro tudo o que você escreve, sou sua fã assumida.
http://denovomaisumavez.blogspot.com/

J. Matheus disse...

Gente, que conto maravilhoso! Amei de verdade! Realmente escolhi o blog certo para me inspirar. :)

Gabriela disse...

estou apaixonada por esse conto *-* você escreve muito bem parabéns!