julho 11, 2016

Eu transbordo


Tenho algumas horas antes do despertador gritar numa tentativa inútil de me acordar, sendo que nem mesmo cheguei a adormecer. A noite não acalma, a lua não me ouve, os ponteiros dos relógios correm as horas e eu paro. Novamente aqui. Com esse famoso bloco de notas sempre aberto no canto direito dessa tela, esperando que eu consiga deixar mais alguma coisa ir. E eu escrevo e apago, com medo de perder uma mísera letra. Eu não quero perder nada. 
Deixa eu ser egoísta dessa vez e engolir o mundo, mesmo sabendo que assim eu não consigo mais. Deixa eu me iludir mais uma vez que tudo isso vai passar, que é temporário e que o tempo vai curar todas as minhas dores e medos. Que a minha ingenuidade fale mais alto e pinte flores no meu destino, como uma forma de acalentar as minhas decisões e facilitar meus árduos caminhos. Porque o inverno arrancou todas as flores e folhas das minhas árvores, deixou a estrada seca e vazia. E o vazio me apavora.
Me completa com seus vazios, me deixa mentir para mim novamente que tudo isso é suficiente e que eu não preciso de nada mais. Me ilude mais uma vez dizendo que de fato eu estou completa aqui. Conta mais uma vez aquelas suas histórias de futuros, me coloca na tua peça como uma personagem e cria pra mim um final feliz. Deixa eu acreditar, pelo menos por hoje, nessa noite fria de inverno, que você consegue me moldar e que eu não preciso tentar escapar.
Mas o molde não cabe. Eu não caibo na forma já moldada. E por mais que eu tente, minhas pernas vazam. Meus braços ficam apertados e precisam mudar. A cabeça acaba de fora. Os pés sobressaem. Mas eu queria tanto. Me encolho, entorto meus braços, encurvo a cabeça. Mas não cabe. Eu não consigo mais, os braços já estão dormentes, as pernas congeladas, e a cabeça precisando descansar em um espaço dela. Por mais que eu queira tanto caber no teu molde, eu não posso fugir da minha estrutura. Porque, querido, eu não caibo em você, mas eu também deixei de caber em mim. Eu transbordo todos os dias. 

Desculpa. 

De fato agora o primeiro texto de 2016. 

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