fevereiro 07, 2014

Monólogo


"Our song on the radio, but it don't sound the same."*

Eu não sei como começar isso de outra maneira, então talvez deva deixar que as palavras simplesmente vazem e escorram por essa mesa bonita. Já pedi desculpas pelas marcas de copo no vidro, sabe como não sou atenta a esses detalhes. Ainda mais hoje. Ainda mais depois de tudo que foi e já não volta e não sei lidar. Nunca sei lidar. E isso está ficando mais uma vez como qualquer outro texto, mesmo eu mudando a música, mudando o ritmo, mudando de você. As malas relutantemente fecharam com poucas mudas de roupas e um punhado de memórias. A saudade tentou entrar mas acabou cabendo só em mim. Tá morando aqui no bolso do jeans, na manga da camiseta, no buraco do peito.
Tudo bem, eu sei que não é culpa de ninguém essas coisas, tem a ver com o destino e toda essa parafernalha, é a tal da vida querendo ocupar seu lugar e me mudando de outros. Mas seria bom de vez em quando ouvir umas respostas mais longas, sem tantas entrelinhas e enigmas. Uma resposta simples, concreta e direta. Tá certo? Está. Tô indo bem? Não tô. Nem esse pseudo-diálogo-monólogo está conseguindo dizer alguma coisa. As suas respostas não aparecem após meus travessões, não há movimento algum do seu personagem. Onde foi parar você? Como posso descrever se as suas mãos tremeram ao ouvir essa ou outra frase se não te vejo mais? Despedidas são terríveis, e as solitárias ainda piores. 
As coisas não andavam fáceis mesmo, eu sei que foi difícil passar por tudo isso. Mas é que nem tudo são flores pra ninguém meu amor. As dificuldades atravessam o teu e o meu mundo. Não quero te falar de cada problema, de cada noite mal dormida, ou das inúmeras lágrimas engolidas por esse travesseiro que agora escapa da mala. Porque em cada dor escondida tinha um pouco de você. Em cada parte minha tinha um pouco de você. A escolha do pretérito foi puramente gramatical, não leve a mal. Só me leva daqui. Pode deixar ali naquela quadra, tem uma casa bonita que me acolheu vez ou outra nessas noites ruins. Não tem essa mesa de vidro, nem muito menos sua estante de livros cultos, mas a gente vai lidando. Mesmo eu não sabendo lidar nem comigo. Tem gente que gosta de tentar fazer isso, tô deixando, vai que conseguem. 
Aquela música de desistência fez bastante sucesso em mim durante esse mês. Você já deve ter ouvido, deixei trechos em vários locais. Ou você também se fechou para isso? Desculpa. Eu sei que não deveria ter vindo aqui e ter deixado mais uma vez o teu tapete meio torto, o espelho borrado e a loça por lavar. Foi um último adeus de meia hora. Uma despedida de alguns dias. Uma carta suicída até a próxima reencarnação do nosso amor. E ele volta, meu querido. Ah, ele sempre volta.

Mas agora quem está indo sou eu, talvez leve mais tempo para conseguir mudar todas as coisas de lugar e me adequar nesse novo lar. Quem sabe eu volte, ou volta você. As palavras serão sempre suas, mesmo que em outro apartamento. 

Um comentário:

Ângela Guidi disse...

Desculpe-me por não fazer um comentário construtivo, mas estou realmente sem palavras para o seu texto. Não só este, mas todos os outros. Sua escrita é super gostosa de ler e seus textos são lindo! Parabéns.

Beijos, Ang
http://angelaguidi.blogspot.com.br/